sábado, março 30, 2013

cicatriz

Postado por Camilla Bazzanella
É engraçado pensar em tudo que aconteceu naquele fatídico primeiro encontro. Até hoje ainda não sei explicar exatamente como a gente foi parar naquela praia deserta que todo mundo tem dificuldade de encontrar.

Lembro-me de como a gente ria e dividia uma garrafa de bebida enquanto tropeçava por uma trilha no meio do mato. Eu de vestido e salto relativamente alto e você de calça jeans e camiseta e um tênis que parecia confortável demais agora que as solas dos meus pés estavam ardendo.

- Nunca mais usarei salto de novo, pelo resto dos dias que passarei nesse planeta. - murmurei. Parecia que a bebida fazia com que as palavras ficassem difíceis demais de pronunciar.

- Sabe que isso não é verdade, né, Scar? - você riu, olhando pra mim com as sobrancelhas arqueadas. Eu revirei os olhos, sem nem tentar discutir porque é claro que não era verdade. Você tinha razão. Você sempre tinha razão e eu sempre tive dificuldade em entender como isso era possível. Sério.  Todo mundo diz que a mulher é quem está certa no relacionamento e que essa é uma verdade inalterável, mas não era isso que acontecia com a gente. Talvez porque não fôssemos normais. Talvez porque nós estávamos bem à frente desses estereótipos bobos que a sociedade nos impõe.

E eu já mencionei o quanto amava você me chamar de Scar? O fato de isso significar "cicatriz" me fazia sentir vulnerável e poderia ser algo ruim mas não era porque eu sabia que você estava ali pra me proteger. Você nunca me machucaria, nunca me causaria um ferimento que pudesse virar cicatriz.

Mesmo antes de te conhecer de verdade, mesmo antes do primeiro e do segundo e de todos os outros encontros acontecerem, eu já sentia que você me protegeria. Foi por isso que, dois dias após a festa do Lucas, eu finalmente criei coragem pra catar o papelzinho em que você havia escrito seu número e te mandar uma mensagem, e quando você me convidou pra sair, não pensei duas vezes antes de aceitar.

Você me levou pra jantar num restaurante chique e caro e depois de comermos e bebermos demais a gente ainda passou no mercado da esquina do restaurante e comprou uma garrafa de vodca. E aí a gente andou, andamos pra caramba conversando sobre tudo e sobre nada e foi quando você me chamou de "Scar" pela primeira vez.

Foi estranho porque era um apelido tão óbvio para meu nome - Scarlett - e ainda assim ninguém havia me chamado daquele jeito antes.

- Deve ser porque pensam que você vai ficar ofendida. - você concluiu, dando de ombros.

- Por que você pensou diferente? - indaguei, curiosa por ouvir você falar mais. Sua voz era ao mesmo tempo aveludada e rouca e eu não conseguia evitar te imaginar cantando alguma coisa.

Sorrindo, você respondeu algo que jamais esquecerei: - Tenho certeza de que você é muito mais forte do que imagina ou deixa transparecer.

Talvez eu seja. Não posso dizer com certeza. Quer dizer, passei por muitas situações em que fui obrigada a ser forte e sucedi, é claro que sim. Mas na lista de desafios a serem enfrentados, eu nunca imaginei que nosso fim seria um dos itens.

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